domingo, 29 de maio de 2011

Uma estória curiosa - ou extraordinária!

Primavera de 1981. Mais exatamente: dia primeiro de Abril (não é mentira!). Estou numa fila de pessoas de diversas regiões do mundo, supostamente já inscritas em cursos do idioma local, em uma pequena e charmosa cidade da Alemanha. É um sábado, e estamos nos apresentando para recebermos orientação e material do curso, com início previsto para o próximo dia 3, Segunda-Feira. O atendimento flui bem, sem demora. Chega minha vez. O funcionário solicita que eu aguarde, e sai da sala. Cerca de dez/quinze minutos depois, retorna. Aquela surpreendente espera não me intranquiliza, apenas me inculca um pouco. Ele diz que está tudo bem, e me entrega o material. Recebo também uma nota de dez marcos que - esclarece ele - se refere a devolução por motivo de aulas que não serão ministradas.

(Agora viajo no tempo, e relembro os antecedentes de minha chegada aqui.)

Quando me inscrevi no vestibular, na década de 60, havia três possibilidades  na área de Letras: Neolatinas, Anglogermânicas e Clássicas. Descartei a primeira, em virtude do grande elenco de matérias. Quanto à segunda, fugi – assustado - do alemão, que eu julgava quase impossível aprender. Então, só me restaram as Letras Clássicas, tendo por base o latim e o grego. Dois anos depois, pude optar pelo curso Português/Inglês, tendo para isso me submetido a teste desse idioma. Tal é minha formação acadêmica.
Lembrando meus anos do – então – ginásio, me dou conta de que sempre me imaginava fazendo um curso de inglês na Inglaterra, sonho que nunca realizei. Paradoxalmente, jamais sequer pensei em estudar alemão - muito menos na própria Alemanha!

Certa noite, alguns anos após minha conclusão do curso universitário, e já exercendo o magistério, principalmente com relação ao inglês, chegou às minhas mãos, por mero acaso (?), um pequeno livro da série “aprenda sozinho”, editado em Londres, destinado ao ensino do idioma germânico.
Considerei esse achado um desafio, depois de ter evitado o estudo do alemão, anos atrás. Assim, com determinação e a ajuda de colega de trabalho, mergulhei naquele livrinho – que guardo até hoje – da primeira à última página. Em seguida, depois de cerca de ano com aulas particulares, ingressei no Goethe Institut, em nível já um pouco adiantado. Lá pelas tantas do curso – aliás, patrocinado por meu empregador – comecei a pensar na viabilidade de estudar fora do país. Escolhi, então, uma Unidade do Goethe muito bem
recomendada por um de meus colegas, e enviei-lhes correspondência, em que apenas solicitava informações sobre o curso.
Enquanto aguardava as informações solicitadas, pedi a um companheiro de trabalho – médium atuante – sua opinião a respeito de minha ideia do curso no exterior. Esse amigo, então, me pôs em contato telefônico com outro senhor espírita, muito respeitado, que me desaconselhou a estudar fora do país, pois isso me seria muito dispendioso, e insistiu mesmo que eu deveria continuar  
meus estudos por aqui, A partir daí – certamente por confiar na manifestação daquele médium – desisti convicto daquela ideia, e realmente deixei de pensar nisso.
Entretanto, numa tarde, aquele companheiro do dia-a-dia me surpreendeu com esta frase: - “Quem sabe você vai fazer um curso de alemão grátis!” - Embora surpreso – claro -, não me abalei ao ouvir isso, até porque já tinha acatado o sábio conselho do mestre espírita.
Nessa mesma época, eu atravessava quase diariamente a ponte Rio-Niterói, e comecei a sentir algo que me deixava muito intrigado e surpreso. Eu via um cenário diferente daquele da baía de Guanabara, embora parecido, pois também envolvia água. Era como se eu estivesse em outro lugar, presente mesmo, sem estar sonhando. Ficava deveras admirado com esta impressão, porque jamais tinha passado por tal experiência - própria de médiuns sensitivos -, e também não mais pensava – com certeza – em viajar.
Assim, segui com minhas aulas no Goethe-Rio. Entretanto, aquela sensação muito estranha continuava.
Alguns meses depois, recebi correspondência da Unidade daquele Instituto, para onde eu havia escrito, unicamente solicitando informações sobre determinado curso.
Para minha enorme surpresa, não se tratava de simples informações. Era a confirmação de matrícula naquele curso pretendido, com todos os detalhes, inclusive o cartão de participante indispensável na apresentação. Ou seja: tudo  exatamente como se eu tivesse efetuado o pagamento do curso!
Imediatamente procurei descobrir o que havia acontecido. Meu primeiro passo foi levantar a hipótese de possível concessão de bolsa de estudo, junto aos membros da Comunidade da igreja alemã, de que eu  fazia parte. Todos negaram, descartaram a possibilidade de qualquer engano por parte dos administradores do curso, e me incentivaram bastante a aproveitar aquela oportunidade. Em seguida, consultei familiares e diversos amigos: todos me animaram – efusivamente – a atender ao curso. Diante de tudo isso, decidi viajar com tal objetivo, absolutamente sem medo nem culpa.
Depois da apresentação no Instituto – conforme narrado no início -, acomodei--me na residência para onde havia sido previamente designado, localizada próximo ao Curso. 
Também conforme previsto, as aulas começaram no dia 03 de Abril. No decorrer do Curso, todas as minhas expectativas iam sendo plenamente realizadas: ótimo planejamento, professores excepcionais, instalações adequadas, intercâmbio enriquecedor com “colegas” de diversas partes do mundo, tudo funcionando perfeitamente. Além disso, ressalto as atividades extraclasse: passeios, visitas, o dia-a-dia na cidadezinha muito charmosa e tranquila. Quanto ao uso do idioma, me sentia gradativamente mais seguro e à vontade.
Tudo corria muito bem. Cerca de um mês após o início do curso, fui chamado à Secretaria. Disseram não ter localizado meu depósito. Com absoluta serenidade, informei que não havia efetuado nenhum pagamento. Então, eles me perguntaram como eu havia recebido toda a documentação necessária para o Curso, sem nada ter pago. Eu disse que supunha ter ganho uma Bolsa de estudo, mas não fazia ideia de quem pudesse ter sido meu patrocinador.
Dias depois, fui novamente convocado para esclarecimentos. Dessa vez, o questionamento partiu da Sede do Goethe, em Munique, através de contato telefônico. Repeti integralmente o que já havia dito, e com a mesma total tranquilidade.
Nunca mais fui chamado à Secretaria. Certa ocasião, por lá passando ocasionalmente, um funcionário a mim se dirigiu, dizendo que eu havia ganho o Curso em virtude de erro do computador. Nada mais me disse, e eu nada comentei.
As aulas continuaram em absoluta  normalidade, até o fim de maio. Só para lembrar: o ano era 1981. Ao final do Curso me submeti aos exames, fui aprovado, mas parti logo – a saudade era grande –, sem receber qualquer documento relativo a minha participação.
Alguns meses depois, solicitei-lhes um “Zertificat”. Responderam que o enviariam, desde que eu efetuasse o pagamento pelo Curso.
Mas como eu julguei que tal Certificado jamais me seria absolutamente imprescindível  - como até o momento não o foi e nem o será -, deixei tudo “quieto”. Nada mais aconteceu, e já se passaram praticamente trinta anos desde aquela minha solicitação.

                                RELATO ENCERRADO EM 20/02/2011